Como Fazer Cabeças e Influenciar Pessoas
“Por que investir em
Cuba? Em uma palavra: Oportunidade! Há um potencial enorme no
mercado cubano. Cuba é a maior ilha do Caribe e uma porta de acesso
natural à América Latina e aos Estados Unidos … e a população
cubana é a mais capacitada da região, com 97% de taxa de
alfabetização e que oferece técnicos altamente treinados para
indústrias tecnológicas”.
O texto não é de uma
cartilha de governo bolivariano ou do programa do PT, muito menos de
qualquer peça publicitária do governo brasileiro. É um trecho do
blog “Americans For Cuba” [1], incentivando investimentos das
empresas americanas na ilha. E sem excitar uma revolta histérica da
classe média.
Os sinais de cifrão se
acenderam nos olhares atentos de investidores tão logo o governo
cubano promulgou uma lei favorecendo os investimentos estrangeiros na
ilha, apresentando benefícios fiscais e reforçando a transparência
das relações [2]. Neste contexto, os “cuban-americans” temem,
por conta das inflexíveis leis americanas que impõem o embargo à
ilha, perder espaço para investimentos vindos “do Brasil, China,
Russia e Europa” [3].
Enquanto esses atores
esperam que o presidente americano relaxe as restrições de
investimento privado na ilha, por aqui eles tem um grande aliado: a
mídia direitista, que investe até mesmo a reputação de seus
“jornalistas”, para defender a ideia de que qualquer ação
relacionada à ilha é um sinal inequívoco da presença do diabo em
pessoa no governo, à beira da implantação de uma ditadura
comunista. Estou exagerando? Vamos ver...
Por ocasião da
inauguração do porto de Mariel, analistas internacionais perceberam
[4] o papel de destaque que o Brasil pode ter como parceiro no
investimento massivo na área industrial, por estar politicamente
inserido como parceiro da ilha, podendo colher os frutos de uma
inevitável abertura econômica – nos moldes que a China já
promoveu há anos, atraindo empresas como Apple, Ford, Nike, GAP [5]
num movimento que nem de longe foi chamado de “Chinalização dos
Estados Unidos”, até porque a opinião pública de lá não é
tão... “bovina”... para usar uma expressão Diogo-Mainardiana
(ou seja, escrota). Estes analistas consideram que a intenção do
Brasil ao efetuar investimentos em Cuba é estratégica pois
colocaria o país à frente deste processo de abertura econômica, se
favorecendo das condições oferecidas para a parceira e da posição
geográfica privilegiada (como já citado: porta para as Américas do
Norte e Central).
Em qualquer país do
mundo, levar suas indústrias a nível multinacional é sinônimo de
expansão e crescimento, além de indubitável sinal de liderança
econômica. Para o “jornalista” Reinaldo Azevedo, e o rebanho que
o segue no órgão oficial da imprensa tucana, o investimento é
nefasto, demoníaco. O que o jornalismo internacional (leia-se isento
da politicalha local) coloca como uma cartada para estar à frente de
um novo mercado, é colocado pela Veja à sua platéia como sendo um
absurdo, no que a claque repete: absurdo!! Cubanização!! Currupaco
paco paco!!!
Como isso ocorre?
Usando de métodos nada novos, e muito utilizados para persuasão nos
discursos que marcaram Hitler na ascenção à liderança nazista e,
depois, da Alemanha. Estes métodos se baseavam em utilizar (a) o
jogo da culpa e do ódio, (b) o jogo do moralista e injustiçado, (c)
o jogo da propaganda oportunista, entre outros (destrinchados neste
fantástico artigo que utilizo como fonte deste argumento) [6].
Colocando esta tese à
prova, vamos avaliar a mesma questão que a BBC vê como sendo uma
jogada de oportunidade para o Brasil ao investir em Cuba, mas agora
sob a ótica do “jornalista” Azevedo [7]: num artigo cuja
manchete apropriadamente se define como “estupefaciente” (ou
seja, entorpecente, talvez se referindo ao efeito mental que quer
causar), ele começa buscando a empatia com o leitor, abrindo a sua
cabeça com o pé-de-cabra do ódio comum (e nós sabemos a quem ele
e o seu rebanho odeiam de paixão, o governo do PT): “Dilma tenta
fazer indústria farmacêutica brasileira migrar para Cuba; se
conseguir, provocará desemprego aqui e vai gerar empregos lá”.
Pronto. Com uma só
machadada ele rachou o crânio de seus leitores para enfiar lá
dentro o que quiser, sem o menor compromisso com fatos, ou receio do
crivo crítico, a essa altura já acorrentado pelo medo e o ódio. A
partir do momento em que o senso crítico do leitor foi destruído,
não importa que se transforme “investir” em “migrar”, ainda
que sem o menor respaldo de fatos ou indícios que levem a essa
afirmação.
Ele continua ganhando o
apoio do leitor – já devidamente amaciado – com afirmações
pirotécnicas ao gosto da torcida: “È que a presidente Dilma, pelo
visto, cansou de governar o Brasil, … agora quer fazer a diferença,
sim, mas lá em Cuba.” A essa altura, o leitor já não pensa, só
dá pulinhos de satisfação enquanto bate palmas ao que considera
“suas palavras”. Nada embasado em fatos, em fontes ou qualquer
outro cuidado jornalístico. Pura deturpação de um fato, salpicada
de opiniões lapidadas para gerar a repulsa e o ódio. Não é à toa
que as palavras “nojento”, “revoltante”, “maldita”,
permeiem os discursos sobre estes “fatos” e a chefe de governo –
chamada espertamente de “soberana” pelo aprendiz de Goebbels.
Depois disso, o que
vier é aceito e absorvido como água em terreno seco (ops,
desculpem, sem intenção de ofender aos conterrâneos paulistas): “A
presidente quer fazer a nossa indústria farmacêutica migrar para
Cuba, de sorte que passaríamos a ser importadores de remédios
produzidos pelos próprios brasileiros, … desempregando brasileiros
e empregando cubanos”. Pronto, o jogo da injustiça foi colocado,
alimentando com mais lenha o ódio semanalmente regado pelo próprio
veículo de mídia.
Acabou o jogo! Nesse
ciclo vicioso, a “denúncia” deturpada de hoje, engolida em meio
à massa do ódio, alimenta esse mesmo ódio, abrindo espaço para
qualquer outra “denúncia” da semana seguinte. Não importa que
seja algo tão vago e inverossímil quanto “O petralha Haddad
desvia água do complexo Cantareira para irrigar terrar áridas em
Marte, o planeta vermelho, portanto comunista”. Está feito o jogo
da propaganda oportunista.
Neste ciclo, não dá
tempo do leitor ruminar uma “denúncia” que a próxima já lhe é
ofertada. Antes que se possa verificar que o fato anterior estava
deturpado ou não apresentou as características que a “denúncia”
trazia - por exemplo, que não se fecharam fábricas aqui para abrir
novas fábricas em Cuba -, uma nova “denúncia” joga outra acha
de lenha na fogueira da histeria, lubrificando o caminho para
qualquer nova bobagem que se queira incutir nos leitores.
É nesse caldo que
milhares de pessoas bradam contra a “cubanização” sem nem mesmo
saber definir o que significa isso. Dessa mesma forma, são
construídos os outros totens dedicados ao ódio que alimenta essa
cisão no país: dos “vagabundos” do Bolsa Família, e da
“falência” atual do Brasil – ao contrário do que anuncia a
“comunista” Forbes, que atribui a vantagem de Dilma ao fato de
ela ter a seu lado um país em situação melhor do que encontrou ao
assumir o primeiro mandato [8] – à idéia de uma “ditadura
comunista” num país onde os bancos transbordam de lucros, nenhuma
propriedade foi estatizada e qualquer lunático pode sair às ruas
pedindo um golpe militar, para arrepio dos professores de ciências
políticas que sabem o significado real dos termos “ditadura” e
“comunista”.
Seria tudo uma grande
piada se não fosse um tanto quanto perigosa, como mostram as
manifestações após a reeleição de Dilma, tentando roubar no
tapetão o que se perdeu nas urnas.
Meu conselho? Antes de
sair babando de indignação pela nova “denúncia” da Veja, ou se
lamentando quanto à “destruição” da nossa economia, pesquise
sobre o tema em uma mídia internacional, não contaminada pelos
intere$$es da mídia tupiniquim, que – aliás – se alimentou e
cresceu muito nos tempos da ditadura, daí talvez as saudades...
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